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Sexting: não caia nessa
Marcela Munhoz
Do Diário do Grande ABC
30/05/2010 | 07:19
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Um dia, acorda-se como anônimo. No outro, não pode mais sair na rua para não ser reconhecido. Isso aconteceu no início do ano com uma garota de 16 anos. O vídeo que fez para o namorado na webcam - masturbando-se com uma escova de cabelo e vestindo uniforme da escola - foi parar no celular de colegas e chegou até no de alunos de outros colégios.

Resultado? A vida da menina virou um inferno. Foi hostilizada, ouviu xingamentos e teve de mudar de escola. "Até meus colegas do inglês vieram me perguntar o que tinha acontecido. Fiquei chocada. Ninguém acreditava na história, mas o vídeo era real", conta Betina*, colega de escola. "Ela foi ingênua demais, confiou no cara. Para mim, os dois estão errados. A imagem dela vai ficar manchada para sempre."

Quando chegou em casa, Betina* contou para a mãe o que tinha acontecido. "As pessoas têm de ter cuidado para não se abrir totalmente para o mundo. Há um limite de privacidade. Hoje não adianta mais proteger o filho dentro de casa, o mundo entra onde ele estiver por meio da tecnologia", diz Raquel*, 46, que aproveitou para explicar à filha que não há problema em descobrir a sexualidade, mas é preciso tomar cuidado. "A masturbação deve ser um ato íntimo e pessoal."

Sexting - O que aconteceu com a menina de 16 anos é considerado sexting, fenônemo que vem rolando nos Estados Unidos e Europa há alguns anos e começa a crescer também no Brasil. Sexting é a união das palavras em inglês sex (sexo) e texting (envio de mensagens) e serve para textos e fotos sensuais (nus ou seminus) enviados por celular, e-mail, webcam, geralmente para paqueras, ficantes, namorados (as), maridos (esposas).

Pesquisa realizada em fevereiro pela ONG Safernet com 2.159 crianças e adolescentes entre 5 e 18 anos revela que 11% já fizeram sexting. Ou seja, publicaram mensagens íntimas ou fotos em poses sensuais.

"Eles querem aproveitar o momento. Não pensam que a foto pode ser vista por futuros chefes, esposas, maridos e filhos. Outro perigo ainda pior é a pornografia infanto-juvenil. Será que não sabem que as fotos vão parar em sites pornográficos?", questiona Rodrigo Nejm, diretor da ONG Safernet.

Para o psiquiatra Aderbal Vieira Junior, a tecnologia facilitou tudo. "Antigamente, era mais dificil um estrago tão grande. As pessoas tinham de se expor mais. Era preciso mandar relevar o filme, por exemplo. Hoje é tudo mais fácil, as imagens multiplicam-se."

Por que expor a intimidade?
"Quem se fotografa nu está lutando para promover sua popularidade", afirma a psicóloga norte-americana Susan Lipkins, que conduziu estudo com 300 jovens para entender o sexting. Ela comprovou que crianças de 9 anos já estão mandando mensagens sensuais. Na opinião de Rodrigo Nejm, da Safernet, todos querem virar celebridade. "Há superexposição do corpo e da intimidade de maneira geral," referindo-se às fotos postadas no Orkut e Facebook.

Preocupada com as histórias que a filha adolescente conta - como a de que colegas da escola fizeram striptease para os meninos - Elaine*, 40, de São Caetano, já discutiu o assunto no blog com outras mães. Ela acredita que os casos de sexting se multiplicaram porque nunca esteve tão na moda fuxicar a vida alheia e expor a própria intimidade. "Estamos na era BBB." Na sua opinião, a melhor forma de ficar de olho nos filhos é fazer parte da realidade deles. "É preciso aprender a utilizar a tecnologia. Invadir a privacidade é bobagem. Se quiser mesmo, o filho vai dar um jeito de fazer."

Sofia*, 16, concorda: "Proibir não adianta, porque há assuntos que não se conta para os pais. Eles precisam aprender a ter confiança em nós."

Outro lado - Além da fama, o sexting serve como diversão, para apimentar a paquera e o namoro e como autoafirmação. Para alguns especialistas, é menos perigoso do que as antigas brincadeiras de sedução porque não há o toque. O tema foi discutido em uma conferência de Direitos Humanos, realizada no Canadá, em 2009. Para Peter Cuming, professor da Universidade York, de Toronto, crianças e jovens são seres sexuais que têm explorado a sexualidade em todos os tempos, todas as culturas e lugares. "A distinção tem de ser feita entre nudez e pornografia infantil."

Noção das conseqüências
Para se exibir ou agradar alguém? Não importa o motivo. O fato é que casos de sexting não terminam bem. As imagens acabam caindo na rede por vingança dos exs, por sacanagem de quem recebeu ou mesmo por acidente de percurso, como roubo do aparelho ou invasão de hacker. É inocência de quem manda ou falta de noção de privacidade?

"Adultos também mandam fotos e textos sensuais. Teoricamente, eles deveriam ter mais noção das consequências", aponta o psquiatra Aderbal Vieira Junior. As consequências para quem se envolve em casos de superexposição são complicadíssimas. Para começar, a vítima nunca vai conseguir tirar as imagens da internet. Além disso, pode sofrer bullying; por isso, tem de pensar antes e não fazer.

"As pessoas envolvidas podem até esquecer do que aconteceu, mas quem está na imagem não", afirma Bernardo*, 17 anos, que confessou postar imagens e vídeos sem autorização dos amigos e ver tudo o que recebe: "Todo mundo tem curiosidade. Não adianta falar que não."

Punição é rara
Quatro Estados norte-americanos consideram o sexting crime de pornografia ou exploração sexual de menores. No ano passado, 17 adolescentes foram acusados pelo crime de pornografia infanti, embora as imagens divulgadas fossem deles mesmos. Mas a Instância de Apelações de Justiça da Pensilvânia decidiu que adolescentes que enviam imagens íntimas do próprio corpo não podem ser enquadrados nesse crime e têm respaldo da lei de liberdade de expressão.

No Brasil, as vítimas, em geral, não levam a acusação adiante por medo de maior exposição. No entanto, processos acontecem. No Rio de Janeiro, por exemplo, dois jovens foram acusados de postar no Orkut fotos de uma adolescente praticando relação sexual mas, depois, descobriu-se que a própria garota postou. "Acho que quem se expõe não precisa de punição da Justiça como acontece nos Estados Unidos. O castigo já é a humilhação. Mas quem espalhou deve ser julgado e condenado", afirma Juliana*, 14. A Delegacia de Crimes Eletrônicos recebe denúncias pelo tel.: 2221-7030, ou acesse o site da ONG de direitos humanos na internet www.safernet.org.br

Nem os famosos escapam
Se para os anônimos já é difícil reverter uma situação complicada de sexting, para os famosos a missão é impossível. Quem não se lembra das fotos sensuais de Miley Cyrus e Vanessa Hudgens, estrelas da Disney, que circularam na internet? E dos dois vídeos eróticos de Paris Hilton, sem contar o flagrante de Daniela Cicarelli?

No caso de Miley, quem divulgou as fotos foi um hacker que invadiu o computador pessoal da garota. A atriz pediu desculpas aos fãs por ter feito as fotos e disse que ficou envergonhada com a situação. Entretanto, mais recentemente, um vídeo de Miley dançando sensualmente para um produtor bem mais velho também deu o que falar. O pai Billy Ray justificou com o comentário "É o que as pessoas de sua idade fazem. Ela estava apenas se divertindo".

Vanessa Hudgens também ficou constrangida depois que várias fotos em que estava nua e de lingerie foram parar na net em 2007. As primeiras foram divulgadas por um ex-namorado e as outras estavam em um celular que a atriz perdeu.

Vanessa soltou um comunicado dizendo "Quero me desculpar com meus fãs, que me apoiam de verdade e significam o mundo para mim. Estou envergonhada e me arrependo de ter feito as fotos. Sou grata pelo apoio de minha família e amigos". A atriz completou que as fotos foram tiradas em privacidade e lamentou terem se tornado públicas.

Já a fama da patricinha Paris Hilton só aumentou após vídeo dela com o ex-namorado cair na rede em 2004. Na época, pediu desculpas e chegou a dizer que tomaria mais cuidado, mas sabe-se que no início do ano ela gravou mais um filme pornô com o atual namorado. Por enquanto, as imagens não foram parar na internet.

Daniela Cicarelli travou verdadeira guerra com o YouTube após imagens dela fazendo sexo com o namorado em uma praia da Espanha terem sido divulgadas na rede por um paparazzo em 2006. Mas, no fim, a apresentadora e modelo perdeu a ação na Justiça. Para o juiz, o casal "agiu despreocupadamente" e o ato "impede que os autores exijam que os órgãos de imprensa tratem como privada a conduta que elegeram como pública".

Recado para os pais
* Fique de olho no que os filhos fazem na net e o que mandam nos celulares, mas procure não constrangê-los nem invadir sua privacidade.

* Converse com eles sobre comportamento de risco e como se proteger.

* Aprenda a navegar e usar tecnologia para se aproximar do mundo deles.

Saiba se proteger e não caia nessa
A adolescência é uma fase de descobertas da sexualidade. Até aí, nada de mau. Mas tem de saber que algumas decisões impensadas e ingênuas de agora podem trazer consequências para sempre. A internet e outras tecnologias, como o bluetooth, ajudam a eternizar o erro. Por isso, cuidado para não cair nas armadilhas e preserve-se! Confira as dicas da Cartilha de Segurança disponível no www.safernet.org.br

* Jamais se deixe levar por pressões - de amigos ou namorados (as) - para produzir ou publicar imagens sensuais, por mais apaixonada (o) que esteja.

* Não confie em ninguém. Suas fotos podem virar instrumento de vingança no futuro.

* Tudo o que se faz online tem consequências fora da internet e para sempre. Imagine seus pais, professores, futuros namorados (as), chefes e até maníacos sexuais observando-a (o) em poses sensuais.

* Uma vez que as imagens ou textos vão parar no ciberespaço, sempre vão ficar lá. É impossível eliminar todas as imagens do mundo virtual. Tornam-se eternas.

* Pode parecer brincadeira inocente, mas mensagem sensual ou foto coloca sua privacidade em risco. Elas podem dizer sobre sua vida para pessoas que você nem gostaria de conhecer.

* Quando tiver dúvidas em relação ao comportamento sexual, converse com seus pais e amigos(as) de confiança em vez de se expor pela internet. Ainda pode procurar o médico ou o professor com que mais se identifica.

* Não há nada de errado em falar e discutir sexualidade. O erro é não se proteger nem se informar sobre como manter relações saudáveis.

* Proteja-se e não permita agressões nem pedofilia.




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